O Poder Legislativo possui duas funções típicas, a função de legislar, ou seja, a tarefa de produção das Leis, e a função de fiscalizar. O Legislativo realiza a fiscalização contábil, financeira, orçamentária, operacional e patrimonial do Poder Executivo, bem como investiga fatos determinados por meio das Comissões Parlamentares de Inquérito. Trata-se de controle político-administrativo exercido com a finalidade de apurar acontecimentos e desvendar situações de interesse público.

Por meio das CPIs realiza-se uma investigação parlamentar. A CPI tem “poderes próprios das autoridades judiciárias” para produzir inquérito legislativo com as conclusões da investigação. Nesse sentido, sua função é meramente investigatória e, se for o caso, as conclusões são encaminhadas ao Ministério Público para que se promova a responsabilidade civil ou criminal dos infratores.

Constituição Federal

O art. 58, §3º da CRFB/88 dispõe o que segue sobre as CPIs:

Art.58 § 3º – As comissões parlamentares de inquérito, que terão poderes de investigação próprios das autoridades judiciais, além de outros previstos nos regimentos das respectivas Casas, serão criadas pela Câmara dos Deputados e pelo Senado Federal, em conjunto ou separadamente, mediante requerimento de um terço de seus membros, para a apuração de fato determinado e por prazo certo, sendo suas conclusões, se for o caso, encaminhadas ao Ministério Público, para que promova a responsabilidade civil ou criminal dos infratores.

Destrinchando esse dispositivo, podemos retirar diversas informações sobre como funciona uma CPI:

Formação

As Comissões Parlamentares de Inquérito podem ser criadas pela Câmara dos Deputados e pelo Senado Federal, em conjunto ou separadamente. Assim, podem existir CPIs da Câmara dos Deputados, CPIs do Senado ou CPIs mistas. É possível ainda a realização de CPIs nos Estados e nos Municípios, a depender do âmbito federativo do objeto de investigação.

As CPIs são uma expressão do princípio democrático na Carta Constitucional, consideradas como “direito de oposição” ou “direito das minorias”. Isso porque, para sua instalação é exigido o requerimento de apenas 1/3 dos membros da Casa Legislativa ou, no caso de comissão mista, um terço dos membros de cada uma das Casas.

Sendo assim, preenchidos os requisitos do dispositivo constitucional supramencionado, existe direito público subjetivo de as minorias parlamentares verem instaurado o inquérito parlamentar, independentemente de deliberação pelo Plenário.

Além disso, a CPI está sujeita a controle jurisdicional. Dessa forma, caso não haja sua instalação quando atendidos os requisitos constitucionais ou, de modo contrário, em não sendo cumprido algum de seus pressupostos, pode haver interferência do Poder Judiciário para obrigar o Parlamento a fazer sua instalação ou para invalidar sua criação.

A CPI da Covid está correndo no Senado Federal, tendo sido objeto de assinatura de 31 Senadores, superando o quórum de 1/3 necessário para sua criação (o Senado Federal é composto por 81 Senadores). Em face da inércia do Presidente do Senado para sua instalação, essa foi determinada por meio de uma liminar em Mandado de Segurança advinda do Supremo Tribunal Federal.

Objeto de investigação e abrangência

O ato que instaura uma CPI deve delimitar precisamente os fatos que serão objeto da investigação parlamentar, não se admitindo investigações genéricas. Entretanto, mais de um fato pode ser investigado em uma CPI, desde que todos sejam devidamente determinados.

Além disso, pode haver a apuração de fatos conexos ao principal ou, ainda, de fatos inicialmente desconhecidos que surgirem durante a investigação, bastando que haja um aditamento do objeto inicial da CPI.

Ressalte-se que as CPIs de um ente da federação não podem investigar fatos referentes aos demais, devido ao princípio federativo. Desse modo, uma CPI federal não pode investigar questões relacionadas estritamente à gestão da coisa pública estadual, distrital ou municipal. Os poderes das CPIs criadas pelas Casas do Congresso Nacional não alcançam, portanto, fatos ligados à competência exclusiva dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios.

Prazo

O ato que instaura uma CPI deve prever o prazo dentro do qual os seus trabalhos serão encerrados. No entanto, podem ocorrer prorrogações sucessivas desse prazo dentro da legislatura (4 anos). Contudo, o final da legislatura sempre representará um termo final para as CPIs.

Poderes de Investigação da CPI

Esse é o ponto que gera mais dúvidas quando o assunto é como funciona uma CPI.

Segundo a Constituição Federal, as CPIs têm poderes de investigação próprios das autoridades judiciais, entretanto, há certas competências que estão sujeitas à reserva de jurisdição, isto é, são exclusivas do Poder Judiciário. Nesse sentido, é relevante sabermos o que as CPIs podem e o que não podem fazer na condução do inquérito legislativo.

Antes de mais nada, importante ressaltar que medidas restritivas de direitos determinadas por CPI devem ser fundamentadas, sob pena de nulidade da decisão. Além disso, há que se observar o princípio da colegialidade, segundo o qual a restrição a direitos deve ser determinada pela maioria absoluta dos membros da CPI, não podendo ser objeto de decisão monocrática.

As CPIs têm competência para: 

a) Convocação de particulares e autoridades públicas para depor:

Particulares, servidores públicos, Ministros de Estado e titulares de órgãos ligados à Presidência da República podem ser convocados para depor em uma CPI na qualidade de testemunha ou indiciado, desde que a oitiva seja necessária à investigação.

A exceção diz respeito ao Chefe do Poder Executivo. O art. 50 da CRBF/88 não menciona a possibilidade de o Presidente da República ser convocado para prestar informações à Câmara dos Deputados e ao Senado Federal ou a qualquer uma de suas comissões. Entretanto, podem ser convocados para prestar informações ao Poder Legislativo, sob pena de crime de responsabilidade, os Ministros de Estado ou quaisquer titulares de órgãos diretamente subordinados à Presidência da República.

Os membros do Poder Judiciário também não estão obrigados a se apresentar perante CPI com o intuito de prestar depoimento sobre sua função jurisdicional, sob pena de violação do princípio da separação de poderes.

As testemunhas, uma vez convocadas por CPI, são obrigadas a comparecer, sendo cabível, inclusive, a requisição de força policial para promover-lhes a condução coercitiva. Em respeito ao princípio da não autoincriminação, não cabe condução coercitiva do investigado.

Testemunhas e indiciados devem ter seus direitos constitucionais respeitados pela CPI, como direito ao silêncio, direito ao sigilo profissional, direito de assistência por advogado, indenização por danos morais e à imagem e etc. Entretanto, uma vez que os trabalhos da CPI têm caráter meramente inquisitório, não se assegura ao depoente o direito ao contraditório.

b) Realização de perícias, exames, buscas e requisição de documentos

As CPIs podem requerer, dentre outras diligências, realização de perícias e exames necessários à dilação probatória, como exames grafotécnicos, análises contábeis, coleta de provas, acareações e auditorias, bem como requisição de documentos e busca de todos os meios de prova legalmente admitidos.

A CPI não pode, entretanto, determinar a busca e apreensão domiciliar. A inviolabilidade domiciliar, garantida pelo art. 5º, XI da CRFB/88 só pode ser mitigada por intermédio de ordem judicial.

c) Determinação de quebra dos sigilos bancário, fiscal e telefônico:

A quebra dos sigilos bancário, fiscal e telefônico podem ser determinadas por CPI, no entanto, isso não coloca as informações em domínio público, havendo o dever de respeito e preservação do sigilo concernentes aos dados transmitidos.

Não confunda “quebra do sigilo telefônico” com “interceptação das comunicações telefônicas”. A quebra do sigilo telefônico consiste em ter acesso aos dados relativos às comunicações telefônicas (horário da chamada, número do telefone, duração da chamada e etc). A interceptação telefônica consiste em ter acesso ao conteúdo da conversa e não pode ser determinada por CPI por estar sujeita à reserva de jurisdição.

As CPIs NÃO TÊM competência para:

Como já mencionado, as medidas que não podem ser decretadas pelas CPIs são as ligadas ao princípio da reserva de jurisdição, ou seja, aquelas que só podem ser decretadas por decisão judicial. A maioria delas já foi mencionada acima, como a proibição ou restrição da assistência jurídica aos investigados, a interceptação telefônica, a busca e apreensão domiciliar de documentos e a convocação do Chefe do Poder Executivo para prestar depoimento. 

Deve acrescentar-se nesse rol a incompetência das CPIs para a decretação de prisões, exceto em flagrante delito e para aplicação de medidas cautelares.

A competência para ordenar a privação da liberdade individual é conferida apenas aos órgãos investidos de função jurisdicional. Sendo assim, como Comissão Parlamentar de Inquérito não dispõe da prerrogativa de julgar, também não possui competência para determinar a prisão de qualquer pessoa. A prisão em flagrante é autorizada a qualquer pessoa do povo, portanto, também pode ser realizada pela CPI.

Ademais, medidas cautelares como indisponibilidade de bens, arresto, sequestro, hipoteca judiciária, proibição de ausentar-se da comarca ou do país também são prorrogativas exclusivas do Poder Judiciário.

Fonte: Estratégia.