Hoje é o Dia Nacional do Intérprete de Libras. Por iniciativa do vereador Alzimário Belmonte, o Gurita (PSD), a Câmara Municipal de Ilhéus comemorou a data, com a realização de uma Audiência Pública, agora à tarde, no plenário Gilberto Fialho. Dados da Associação dos Surdos de Ilhéus dão conta de que a cidade possui cerca de mil deficientes auditivos. Pelo menos 20 deles, matriculados nas redes municipal e estadual de ensino.

O Estatuto da pessoa com deficiência existe desde 2015. Mas há uma série de direitos quer ainda precisam ser consolidados. A opinião é do promotor de Justiça Pedro Nogueira, que participou da solenidade. “Um deles é o direito dos portadores com deficiência auditiva. Não há, de fato, uma política pública voltada para a efetivação da contratação de profissionais neste município”, lamentou.

“Inclusão social não é favor à pessoa com deficiência. É um direito constitucional”, reforça Leonardo Couto Sales, defensor público, também participante da audiência. “Diante de tanta legislação que temos, não sabemos por que ainda essas políticas públicas de inclusão social ainda não foram implementadas. A população de Ilhéus está cansada da falta de políticas públicas de acessibilidade. Em todos os locais da cidade isso é grave. Nos bairros, pior ainda”, reconhece o defensor público.

Exemplos

Ilda Camile é surda oralizada e a primeira psicóloga com esta limitação formada na Bahia. “Quando descobri meu problema foi um mundo novo, tive crise de identidade. A prática não coincide com a teoria e é frustrante, doloroso. A gente vê exclusão”, relatou. “Através do interprete de libras nós temos a esperança, eles lutam por nossas causas”, disse aos presentes.

Matilde Menezes nasceu surda. Se comunicando com o público através dos sinais de libra, ela disse que a mãe não desconfiava que ela era uma pessoa surda. “As pessoas falavam e eu sentia uma agonia muito grande. Fui até a sétima série sem me reconhecer nesta questão. Não me reconheci como surda, por que a minha família também não me reconhecia. Eu sofria na escola”, disse no plenário Gilberto Fialho. Ela defendeu a criação de uma Central de Intérprete para facilitar a vida dos deficientes auditivos e trabalhar na promoção de cidadania.

O caso mais recente é com um membro do Conselho Municipal de Saúde. Deficiente auditivo ele não consegue participar dos encontros virtuais do conselho por falta do intérprete de libras nas transmissões. Um procedimento administrativo está tramitando no MP para garantir o seu direito e é um exemplo que evidencia o quanto é importante e um dever do poder público.

Professora da Universidade Estadual de Santa Cruz (UESC), Lucília Lopes lembra que em 2019, um Projeto de Lei que autoriza o Executivo a criar o cargo de interprete de libras, foi aprovado por unanimidade na Câmara. Mas até hoje não foi feito um curso público para a nomeação dos intérpretes. “O cargo ainda não foi criado, o concurso que já é legal não foi feito e a gente segue cobrando uma coisa que já é”, ironiza.

Desde 2011, na Câmara de Vereadores já há a função de interprete de libras. Na UESC, apenas três professores atendem a 22 turmas de todos os cursos da universidade. Como na instância estadual não é instituído concurso público para a função, os professores não são concursados, são contratados.

A professora Aline Oliveira, que representou a secretária municipal de Educação, lembrou que a Seduc é pioneira na contratação de tradutores nos espaços de formação parta estudantes surdos. “Trata-se de um instrumento para que conquistem o seu exercício de cidadania em qualquer esfera social e em condições de igualdade”, destacou.

Lorena Cerqueira, professora que atua como intérprete, defendeu concurso público, melhores condições de trabalho e cumprimento do piso salarial para os profissionais. São, para ela, as primeiras medidas que precisam ser adotadas.

Direto de São Paulo, onde trabalha atualmente, o professor Shalom Rocha, natural de Ilhéus, reconheceu que imaginava que 17 anos depois do início do seu trabalho, estaria diante de uma situação bem diferente. “Imagina fazer parte de um universo que você não consegue trocar informação. Você faz parte do mundo e existe uma ponte que separa você deste mundo.

Precisamos dar voz aos surdos. São eles que sentem as dificuldades. A gente acha o que eles precisam, mas a gente não pergunta o que eles precisam”, afirmou.