Falta pouco para encerrar-se o ano de 2020 – ano em que o Teatro Popular de Ilhéus completou 25 anos de atividades. Foi um ano que começou com muitas expectativas para a comemoração desse marco na história de um dos principais grupos culturais independentes da nossa cidade. Afinal, o TPI tem um acervo de 32 espetáculos, mais de 500 peças de figurinos, uma diversidade de adereços e cenários, mais de 50 livros publicados por sua própria editora, apresentações de palco e de rua em festivais e temporadas nas principais capitais do Brasil e fora dele, circulação de espetáculos no sertão nordestino, mais de 30 projetos desenvolvidos em comunidades, associações de moradores, escolas públicas, assentamentos de reforma agrária e um público de quase 1 milhão de pessoas.

Apenas no último triênio, de novembro de 2017 a outubro de 2020, o Teatro Popular de Ilhéus realizou 251 apresentações de teatro, música, dança, feiras, exibição de vídeos e debates para um público de mais de 25 mil pessoas, de um total de 215 apresentações previstas e público previsto de 21.600 pessoas. Como parte do processo de formação, promoveu 576 horas aulas de curso de figurinos e adereços para 70 pessoas, de forma gratuita. Também gratuitamente foram realizadas 18 edições do projeto de mediação de novos públicos em escolas, sindicatos, associações de moradores, para mais de 1000 pessoas. Para além disso, o TPI produziu neste período 6 novos espetáculos, participou de 3 festivais no Brasil, circulou em mais de 10 cidades na Bahia e abriu o Sommerwerft Festival am Fluss, em Frankfurt, Alemanha. Ainda manteve em sua sede, a Tenda Teatro Popular de Ilhéus, 20% da plateia gratuita para estudantes de escolas públicas e abrigou como espaço de estágio alunos do Curso Técnico em Teatro do Centro Estadual de Educação Profissional do Chocolate Nelson Schaun.

Tudo isso prova que Teatro Popular de Ilhéus cumpriu o objetivo pactuado e em muitos casos ampliou o alcance das metas. Além disso, a parceria possibilitou uma dilação da abrangência das atividades da instituição, permitindo aprimorar a sua gestão, qualificação da equipe, implementação e busca pela utilização de novas tecnologias, tanto para execução das atividades institucionais como para produção das atividades artísticas.

No entanto, é inegável que a pandemia causou mudanças drásticas na vida de todos, e com o TPI não foi diferente. O convênio com o Programa de Apoio a Ações Continuadas de Instituições Culturais, administrado pela Secretaria de Cultura do Estado da Bahia, garante o pagamento apenas parcial das contas do TPI, mediante o cumprimento de diversas metas de trabalho. O restante das contas sempre foi garantido pela bilheteria dos espetáculos, shows e demais eventos realizados pelo Teatro Popular de Ilhéus, assim como aluguéis de pautas por outros grupos visitantes que sempre puderam contar com o espaço da Tenda para difundir ainda mais as artes e a cultura na região. Mas com o fechamento da Tenda por determinação do isolamento social imposto pelas circunstâncias da pandemia, essa renda foi cortada. Para agravar ainda mais as dificuldades do grupo, o pagamento do convênio estadual atrasou muitos meses, deixando 15 trabalhadores sem renda para sustentar suas famílias.

Apesar das dificuldades financeiras, ainda assim nos preparávamos energicamente para estrear dois espetáculos e lançar um livro sobre a história do grupo. Então veio a pandemia, interrompendo todos os planos para 2020. Mas o espetáculo precisava continuar, e nos reinventamos através do mundo virtual. Foi criado o projeto TPIFLIX, com reformatação do canal no youtube e continuidade da programação mensal, agora de forma online. O grupo ainda estreou o espetáculo “Teodorico Majestade: a última live de um prefeito”, uma nova versão do espetáculo de maior sucesso do TPI adaptado para ser transmitido ao vivo via Zoom, com cada ator em sua própria residência, para um público do mundo inteiro através do computador, smartphone ou smartv. Além disso, vem sendo feita uma campanha de financiamento coletivo para a manutenção do Teatro Popular de Ilhéus e investimento em equipamentos e serviços – e não podemos deixar de agradecer muito a todos aqueles que têm participado, pois cada contribuição é fundamental para ajudar o grupo a continuar trabalhando durante esses tempos difíceis.

Infelizmente, a lona da Tenda vem se deteriorando rapidamente com a ação do sol, chuva e ventos. As dificuldades do grupo culminaram na perda dos dois contêineres onde funcionavam a administração e os banheiros, que foram removidos por falta do pagamento de seus aluguéis. Água, luz, telefone e internet foram cortados, e diversos equipamentos elétricos de iluminação foram perdidos pela ação da chuva, que agora adentra a Tenda com ainda mais violência através da lona completamente destruída. No entanto, seguimos sonhando com a conquista de uma sede própria, pois a Tenda também é um espaço alugado, que o grupo gerencia desde 2013. A conquista de um novo espaço, com estrutura mais segura que a da Tenda, daria ao grupo o gás para ampliar ainda mais suas atividades na região. Mas por enquanto esse sonho ainda não se concretizou, apesar da luta por ele ser contínua.

No contexto excepcionalmente difícil da pandemia, a Lei Aldir Blanc de apoio a grupos e trabalhadores da cultura foi criada para garantir a sobrevivência dessas pessoas e manter a cultura ativa nesses tempos sombrios. Nesse aspecto, o Teatro Popular de Ilhéus se habilitou no edital Jorge Portugal com o que seria o seu principal projeto para este ano, mas infelizmente foi desclassificado por falta de um cartão de CNPJ, demonstrando o excesso de formalismo que a Secretaria de Cultura do Estado da Bahia ainda impõe aos projetos, mesmo em um momento de pandemia em que o recurso era tão necessário para os artistas. Felizmente, o grupo foi contemplado com o Prêmio Cultura Viva e o edital Artes Livres do município.

Ainda assim, existem críticas por parte de algumas pessoas que acreditam que o Teatro Popular de Ilhéus acessa “em excesso” os recursos destinados à cultura. No entanto, está mais que comprovado que o legado desses 25 anos de trabalho o qualifica e o legitima a captar recursos, pois trata-se de um grupo que trabalha o ano inteiro, ininterruptamente – e não apenas em projetos e editais públicos. Ao contrário de outros fazedores de cultura que captam recurso pra outra pessoa ou instituição executar, o TPI é um grupo que cria e executa seus próprios projetos, e cujos integrantes não recebem comissões por tais trabalhos, e sim compõem a sua equipe técnica e artística, trabalhando efetivamente em todas as atividades (de atuação, direção, produção, comunicação, etc) necessárias para fazer um projeto artístico acontecer.

Mesmo sem a Tenda, onde funcionou sua sede entre 2013 e 2020, o Teatro Popular de Ilhéus ainda pretende continuar realizando seu trabalho, seja remotamente durante a pandemia, seja nas ruas com seu palco rodante quando o isolamento social finalmente tiver fim. Afinal, esses 25 anos de ações ininterruptas são provas de um empreendimento cultural exitoso, com uma história de luta e muito trabalho para manter a cultura da nossa região ativa.

As dificuldades que o ano de 2020 nos impôs não acabarão com os nossos sonhos. Nossos votos e desejos para o ano que começará em breve são os melhores possíveis. A principal expectativa do TPI para 2021 é que a Prefeitura Municipal de Ilhéus doe ou ceda um terreno para o Teatro Popular de Ilhéus finalmente construir a sua sede própria – pois esse é o nosso sonho para que possamos apostar em mais 25 anos.

Desejamos também que os políticos eleitos olhem para a cultura como um setor de desenvolvimento econômico e social. Desejamos que a vacina chegue logo para que possamos nos abraçar outra vez. E desejamos, acima de tudo, que o espetáculo continue, seja pela internet, pelas ruas, pelas estradas ou em uma sede própria com a qual sonhamos há tanto tempo. E que venham mais 25 anos de Teatro Popular de Ilhéus.