Protestos violentos, disputas de território entre gangues e incertezas políticas estão entre as principais preocupações do general do Exército brasileiro José Luiz Jaborandy Júnior, comandante militar da missão da ONU no Haiti. O país vive uma crise derivada da renúncia do premiê e da dissolução do Parlamento.
Desde 2004, quando uma crise institucional culminou com a queda do então presidente Jean Bertrand-Aristides, o Brasil comanda a operação de paz no país caribenho, trocando a cada seis meses mais de 1.000 soldados que mantém lá.
“A situação atual do Haiti, em função da instabilidade política, está frágil e volátil, podendo se deteriorar rapidamente. Há manifestações por todo o país e por razões distintas, como melhoria das condições de ensino e aumento salarial para os professores, falta de energia elétrica, falta de água, carência na assistência médico-hospitalar, dentre outras”, afirmou o general em entrevista exclusiva ao G1 a partir de Porto Príncipe.
Na capital haitiana, ele lidera mais de 5.000 militares da missão da ONU para estabilização do Haiti (Minustah). “Temos que admitir que realmente a situação política está passando por um momento de instabilidade e a comunidade internacional está acompanhando de perto”, acrescentou.
Em dezembro, o então primeiro-ministro Laurent Lamothe renunciou em meio a um período de agitação liderado pela oposição, que reivindica também a renúncia do presidente Michel Martelly, acusado de corrupção e de realizar prisões arbitrárias de opositores.
No início de janeiro, o Parlamento foi dissolvido após o fracasso das negociações para estender o mandato dos seus membros. País mais pobre das Américas e com metade da população analfabeta, o Haiti não tem eleições legislativas ou municipais há três anos, devido a diversos adiamentos. A falta de um Parlamento efetivo faz com que o presidente na prática governe por decreto.
“Na capital, a população tem se mobilizado nas ruas em demonstrações tanto pró como contra o governo. Em sua maioria apresentam um viés político e, normalmente, começam de maneira pacífica mas, por vezes, tornam-se violentas, sendo necessária a intervenção do poder público haitiano por meio da Polícia Nacional do Haiti (PNH)”, afirma o general brasileiro.
Cerca de 70% da população do país não possui emprego formal, segundo dados da ONU.
“Quanto aos riscos políticos, posso dizer que sempre existirão e que fazem parte do amadurecimento do processo democrático. A Minustah existe exatamente para auxiliar nesse processo”, diz.
“Do ponto de vista das operações militares, o que mais nos preocupa é o incremento da violência entre gangues rivais na disputa de áreas de influência. Temos tomado as medidas cabíveis”, afirma. “Temos conseguido manter a segurança no país, mesmo com este cenário de instabilidade política”.
Antes de comandar a tropa no Haiti, o general esteve à frente da região militar responsável pela defesa do Pará e atuou em duas operações das Nações Unidas na América Central.
Questionado sobre se há temores de excesso de autoritarismo e ameaças à democracia, diante do cenário frágil, o oficial respondeu que era “difícil dizer”, mas que “acreditava que não”.
“Tanto a comunidade internacional, como a própria oposição, estão bastante vigilantes quanto a isso. Penso que qualquer indício poderá comprometer os investimentos e o aporte financeiro internacional”, entende o general Jaborandy.
Redução do efetivo da ONU
Segundo o brasileiro, o Conselho de Segurança da ONU deve votar em março o prosseguimento do cronograma de redução das tropas internacionais do país, que poderá cair a quase metade do efetivo atual e ficar em apenas 2.370 soldados. Logo após o terremoto que devastou o país em 2010, a ONU chegar a ter mais de 14 mil militares no Haiti.
O general diz que não se pode afirmar categoricamente se a ONU vai ou não manter o planejado, diante da situação atual.
“Qualquer que seja a decisão do Conselho de Segurança da ONU, estaremos prontos para executar. Temos plena confiança que nossa tropa saberá dar continuidade ao legado dos seus antecessores e que as forças haitianas saberão conduzir seus próprios destinos”, acredita Jaborandy.
Em 2 de janeiro deste ano, um soldado brasileiro de 21 anos foi baleado na perna em Cité Soleil, a maior e mais violenta favela de Porto Príncipe, pacificada pela tropa brasileira em 2007. O suspeito de acertar o brasileiro estava escondido e fugiu. A situação de segurança no local voltou a se deteriorar após esse processo.
“Cité Soleil é a região mais desfavorecida socialmente da capital do Haiti. A maior parte de seus habitantes são pessoas simples e humildes. Pessoas de bem. Porém, a marginalidade que existe em toda grande cidade, se esconde nas vielas das favelas de Cité Soleil”, explica o general, salientando que o soldado está em recuperação e deve voltar às atividades em algumas semanas.
Do G1
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