O professor de Literatura Brasileira na Universidade Estadual de Feira de Santana (Uefs), Jorge de Souza Araújo, de 68 anos, não precisou de dinheiro público, mas apenas do seu esforço solitário para criar o Instituto de Humanidades e Cidadania (IHC), que ergueu no modesto bairro Bela Vista, 450, na cidade de Santo Antônio de Jesus (a 185 km de Salvador), no Recôncavo baiano.

No local, disponibiliza um acervo de 30 mil livros, dois mil filmes, jornais, revistas e obras da literatura baiana, brasileira e estrangeira, como romances, poesias, contos, crônicas e memórias, e livros de psicologia, sociologia e história. O IHC pretende ser uma referência em estudos culturais e de pesquisa para estudantes do ensino fundamental e médio, acadêmicos e pesquisadores.

Araújo saiu de Ilhéus, no sul do estado da Bahia, e mora há cinco anos, por questões afetivas, como ele mesmo conta, na cidade de Santo Antônio de Jesus.

“Vendi a minha casa em Ilhéus e mudei para cá. Casei em Santo Antônio. Trouxe todo meu acervo e equipamentos e fui arrumando numa casa que comprei e reformei com o salário de professor”, conta.

Espaço interior

No instituto, conseguiu criar um espaço é lúdico e acolhedor. Mas, segundo o professor, o IHC ainda está em formação jurídica.

“Não temos pessoal especializado, como bibliotecários, mas já temos todo planejamento para acolhê-los”, informa.

Daise Rocha, mestranda em Literatura Brasileira na Uefs, ajuda como orientadora no IHC. “No momento estudo duas autoras baianas, Ildefonsa Laura César e Jacinta Passos, que se destacam na luta pela emancipação da mulher. Ajudo como orientadora a quem chega ao IHC”, contou.

A fachada do IHC é pequena, mas o espaço interior é amplo. Possui salas de leitura e de estudos, um auditório e uma videoteca.

Cada setor homenageia uma figura do cenário cultural da região, como o artista plástico Marepe, reconhecido internacionalmente por instalações que revelam a identidade local, assim como Pedro Kilkerry e Silvestre Evangelista.

Jornalista e escritor, o professor Jorge Araújo cuida sozinho do acervo – e com a dedicação de um operário, como ele se define: “Queremos ser um centro de referência sociocultural, não apenas um local de leitura”.

A falta de dinheiro não impediu melhorias, como a instalação do mobiliário e modernização da estrutura. Onde antes era uma garagem, agora é a Sala de Referências Isaías Alves, educador com participação na fundação da Faculdade de Filosofia e Ciências Humanas da Universidade Federal da Bahia (Ufba), para alunos do ensino médio.

Na entrada, encontra-se a Sala Silvestre Evangelista, escritor que também dá nome a uma rua e a uma praça da cidade. Nela, estão obras da literatura baiana.

Araújo guarda, encadernados por assunto e autores, os exemplares do suplemento Caderno de Cultura do Jornal A Tarde, para o qual escreveu diversos artigos sobre o leitor colonial, de 1992 até a extinção do suplemento.

Literatura

“O Caderno de Cultura não é mais editado. Hoje tenho vários exemplares de A Tardinha, revista Muito e o 2+, que é o atual suplemento de cultura do A Tarde”, conta.

A Sala Renato Almeida, ensaísta, é dedicada a estudos, pesquisa e leitura da literatura brasileira, e também um anexo para estudo das obras de autores estrangeiros, como literatura alemã, inglesa e argentina.

O Centro de Estudos do Recôncavo e Sertão (CER) e o Centro de Estudos da Linguagem (CEL) são abertos a professores e pesquisadores. A Sala Pedro Kilkerry, poeta e ensaísta santoantoniense, serve a projetos editoriais.

Espaços multiúso são modernos

O Instituto de Humanidades e Cidadania tornou-se um espaço aberto à comunidade acadêmica e para  estudantes de escolas públicas e particulares, assim com ao público em geral. Situado em bairro simples, possui  espaços multiúso modernos.

A Sala Multiúso Marepe,  homenagem ao artista plástico santoantoniense, possui objetos que  remetem ao artista, num espaço educador. Marepe, que em uma das fases da sua criação utilizava objetos do cotidiano, como latas de cerveja, trouxas de roupa, caixas de cigarro ou papelão, é bem representado nesse espaço, onde um tanque com água foi transformado em aquário e uma máquina de datilografar em uma mesinha com gavetas e suas teclas em  suporte para plantas.

Surpresa

“Na multiúso, assistimos a filmes autorais, como dramas, comédias, ação e aventura”,  diz o professor. Segundo Jorge Araújo, a ideia é que o instituto e todo acervo sejam usados no incentivo a leitura e pesquisas. “O objetivo é ser um braço avançado das universidades públicas da região, como UFRB e Uefs, e particulares. Porém, qualquer pessoa da comunidade tem acesso”, diz Araújo, que já lecionou na Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), Ufba e Universidade Estadual Santa Cruz, em Itabuna.

O médico Everaldo Ferreira Júnior se impressionou ao  conhecer o IHC. “Ninguém imagina que a cidade tem um espaço como esse, quando nem a biblioteca municipal é estruturada.  É realmente um espaço singular”, diz ele.

A vice-presidente do IHC,  professora Carla Quadros, diz que o local servirá também como um centro de formação de professores, que  precisam de uma formação continuada. “Além disso, o espaço também será usado para a contação de histórias e para visitação”, ressaltou.