A busca dos partidos por candidatos a deputado federal passa longe da afinidade ideológica ou programática. Dirigentes das siglas nos Estados fazem leilão para atrair nomes com bom potencial e oferecem até dinheiro. O valor do “passe” pode chegar a R$ 1 milhão, fora o que será destinado à campanha. Mesmo candidatos sem chance de vencer, mas com alguma capacidade de atrair votos, estão na mira das legendas.

Se antes os partidos podiam se coligar e a soma de todos os votos dados ao grupo ajudava a conquistar uma vaga na Câmara, a partir desta eleição a sigla só poderá contar com seus próprios candidatos. Assim, os votos dos que não ganham a eleição são fundamentais para as “estrelas” da chapa conseguirem uma cadeira de deputado federal.

Durante sete meses, o Estadão conversou com dirigentes partidários, deputados, suplentes, advogados, procuradores eleitorais e cientistas políticos e colheu evidências de um mercado de compra de candidaturas. No diagnóstico de especialistas, esse vale-tudo na busca por chapas competitivas corrói a importância das siglas, dificulta coalizões e faz a representação política ser pautada por interesses privados.

Presidente do PMN em Minas Gerais, Agnaldo Oliveira admite que negociatas são comuns e envolvem dinheiro, além do Fundo Partidário: “O cara não tem expressão, tem 25 mil votos, não ganha eleição em partido nenhum. E diz ‘quero vender esses votos’. Vou para o seu partido, quanto você me dá de dinheiro?”.

Esse tipo de candidato é conhecido como “escadinha”: aquele que entra na disputa só para empurrar as estrelas do partido para cima, para alcançarem, na soma final, os votos necessários e se elegerem.

O advogado Marcus Alves, que atua na recriação da velha UDN, partido conservador pré-ditadura militar, tem experiência nesse mercado e afirma que as ofertas não se restringem a recursos do fundo eleitoral, verba legal para financiamento das campanhas. “Hoje o candidato virou uma pedra preciosa. O cara que teve uma votação boa está cobrando para entrar no partido.”

Ele conta que conversou com um candidato que teve 90 mil votos para federal em SP e negocia com três siglas. Uma ofereceu R$ 600 mil, outra R$ 800 mil. Ele quer R$ 1 milhão.

“Os candidatos que tiveram muitos votos estão se valorizando. Quem teve 80 mil votos vale ouro. Pede dinheiro para colocar no bolso, fora o fundo eleitoral. Isso é no Brasil todo”, afirmou Marcus Alves.

Na disputa de 2018 no Distrito Federal (DF), o advogado Paulo Fernando Melo obteve 31 mil votos, distante da média de 73 mil que os eleitos conquistaram. O resultado, porém, tornou o neófito um “candidato” muito cortejado para 2022. Quatro partidos disputaram seu passe: PP, PTB, PL e Republicanos. Ele admite que recebeu oferta de dinheiro, mas diz que, no seu caso, são “recursos para campanha”.

“Sempre oferecem. Não é caixa 2, não. É dentro do fundo (eleitoral), para aqueles 45 dias de campanha. Isso aí é normal oferecer. Uns oferecem menos, outros mais. O dinheiro por si só não elege, né? Já vi muitos candidatos gastarem milhões e não ganharem”, contou o pré-candidato, que decidiu fechar com o Republicanos.